Com o respaldo de Jair Bolsonaro, o Congresso derrubou nesta quarta-feira (17) os vetos presidenciais ao dispositivo que concede anistia em tributos devidos por igrejas, que têm mais de R$ 1 bilhão em dívidas registradas com a União.
Na Câmara, os vetos foram votados em bloco e rejeitados com outros dispositivos que faziam parte de um acordo, como itens do pacote anticrime, da lei de falências e da LDO (Lei de Diretrizes Orçamentárias). Ao todo, 439 deputados votaram pela derrubada do veto. No Senado, a votação também foi em bloco, com o veto sendo derrubado por 73 votos – eram necessários 41.
O perdão às dívidas de igrejas é criticado pela equipe econômica, que destaca o impacto fiscal da medida. Conforme já mostrou o jornal Folha de S.Paulo, somente na Receita Federal o total de débitos pendentes de entidades religiosas é de aproximadamente R$ 1 bilhão, de acordo com informação colhida pelos auditores a pedido do Congresso em meados do ano passado.
O presidente Bolsonaro afirmou na ocasião que era obrigado a vetar o perdão para as igrejas, alegando que poderia passar por um processo de impeachment, por desrespeito à LDO (Lei de Diretrizes Orçamentárias) e também a Lei de Responsabilidade Fiscal. No entanto, pediu ao Congresso que derrube o veto.
Na PGFN (Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional), havia na mesma época outros R$ 462 milhões em dívidas registradas.
A proposta que beneficia entidades religiosas foi criada pelo deputado David Soares (DEM-SP) e inserida em um projeto de lei sobre a resolução de litígios com a União. Ele é filho do pastor R. R. Soares, fundador da Igreja Internacional da Graça de Deus (entre as principais devedoras).
O texto altera a lei de 1988 que instituiu a CSLL (Contribuição Social sobre Lucro Líquido) para remover templos da lista de pessoas jurídicas consideradas pagadoras do tributo, além de anular autuações que desrespeitem a premissa. A justificativa é que a Constituição dá proteção tributária às igrejas, mas o argumento é contestado.
Em outro trecho, o projeto concede anistia retroativa à cobrança de impostos previdenciários nas remunerações pagas a membros religiosos (como os pastores). A proposta busca aplicar o entendimento que os valores não são remunerações.
Na visão de membros do Fisco, as igrejas muitas vezes pagam salários a um grande número de pessoas, de empregados a pastores, e classificam os repasses com outros nomes (doações, por exemplo). Como muitas vezes as igrejas têm um grande número de empregados, a União deixa de recolher um volume significativo de recursos em Imposto de Renda e contribuições previdenciárias.
Nem todas as igrejas seguem a prática. Auditores afirmam que há casos em que os empregados e pastores são registrados conforme rege a lei, inclusive sob o regime da CLT (Consolidação das Leis do Trabalho).
O dispositivo foi inserido em setembro na Câmara no projeto que regulamentava o pagamento de precatórios e mantido pelo Senado, mas vetado por Bolsonaro. Na ocasião, o presidente afirmou que, se fosse deputado ou senador, votaria pela derrubada do veto.
Na tentativa de manter o veto, o Ministério da Economia tentou argumentar que poderia apresentar uma proposta para futura avaliação desse tema pelo Congresso.
“O veto não impede a manutenção de diálogos, esforços e a apresentação de instrumentos normativos que serão em breve propostos pelo Poder Executivo com o intuito de viabilizar a justa demanda”, informou na justificativa do veto.
Também foram derrubados vetos a dispositivos da nova Lei de Falências. Entre os trechos que terão a validade mantida, alguns provocarão perda de receitas para a União, sem indicar uma fonte de compensação.
Há, por exemplo, o artigo que amplia as compensações tributárias que podem ser feitas por empresas em recuperação judicial ou falência decretada. Outro trecho mantido define que receitas obtidas pela companhia em processo de recuperação não será usada para calcular a cobrança de Pis/Cofins.
Os parlamentares ainda rejeitaram vetos a trechos da Lei de Diretrizes Orçamentárias de 2021, que fornece a base para a elaboração do Orçamento do ano. Um dos dispositivos deve ampliar o volume de recursos indicados pelos parlamentares para serem aplicados em obras nas suas bases eleitorais.
O artigo cria marcadores de despesas para emendas indicadas por comissões temáticas e pelo relator do Orçamento. Ao vetar o dispositivo, o governo argumentou que a medida aumenta a rigidez do Orçamento e contraria a Constituição.
Outro dispositivo que teve veto derrubado libera o empenho de recursos do governo federal para obras que ainda não receberam licença ambiental ou não têm projeto de engenharia concluído.
Em outro veto derrubado, o Congresso também derrubou um dos vetos presidenciais ao Programa Casa Verde Amarela, que substituiu o Minha Casa Minha Vida. Com isso, volta a vigorar um regime especial de tributação para as empresas que vão construir unidades habitacionais no âmbito do programa no valor de até R$ 124 mil.
De acordo com esse dispositivo, essas construtoras ficam autorizadas a pagar de maneira unificada os tributos equivalentes a 4% da receita mensal auferida pelo contrato de construção.
Em uma vitória do governo, o Congresso manteve os vetos do presidente Jair Bolsonaro referentes ao novo marco do saneamento.
Enquanto a maior parte dos vetos foram votados em bloco, a legislação referente à nova legislação do saneamento foi uma das que precisou ser votada em separado na Câmara, em decorrência da falta de acordo entre os líderes.
A resistência maior ao veto estava no Senado, mas a votação naquela casa só aconteceria em caso de derrubada na Câmara, o que não aconteceu. O veto foi mantido pelos deputados por 292 votos, contra 169 e uma abstenção. Eram necessários 257 votos para a sua derrubada.
O principal dispositivo em discussão era o polêmico artigo 16. A manutenção do veto elimina a possibilidade de renovação dos atuais contratos celebrados entre municípios e estados com as empresas estaduais de água e saneamento.
O projeto de lei aprovado no Congresso abria a possibilidade de renegociação e renovação desses contratos por um período de 30 anos, desde que isso fosse feito até 2022. Serviços prestados hoje sem contrato poderiam ser regularizados.
O dispositivo foi duramente criticado pela equipe econômica, que argumentava que iria atrasar em muitos anos a entrada da iniciativa privada nesse mercado.
A oposição tentou retirar o veto ao marco do saneamento da pauta, sem sucesso.
“Aqui as empresas de saneamento são extintas, porque se extingue os contratos de programas. E o que o art. 16 prevê é a possibilidade de 2 anos para a renovação desses contratos. Tirando esses 2 anos, não há mais chance de contrato de programa. As empresas públicas não vão mais poder fazer a prestação dos Municípios”, afirmou o deputado Afonso Florence (PT-BA).
“Vai cair o valor das empresas, porque o que elas têm de ativo é isso. A abertura de capital e a venda de ação depreciam. Isso é um crime de lesa-humanidade contra o povo brasileiro”, completou.
O novo marco do saneamento foi aprovado no Congresso em junho do ano passado, com o objetivo de universalizar o saneamento básico no país até 2033.
FONTE: O Tempo