Saiba quem protagoniza o vídeo compartilhado por Bolsonaro

Performer Paulx Castello/Sofia Lacre formado na Argentina, que fala de si no gênero feminino, apagou redes sociais e está apreensivo, dizem amigos | Foto: Reprodução

Não foi um ato espontâneo nem excessos de Carnaval. A cena exibida em vídeo compartilhado pelo presidente da República, Jair Bolsonaro, na noite de terça-feira (5), era uma performance de um artista e ativista que se dedica a discutir “sexualidades não normativas”. Na cena divulgada mundialmente, uma pessoa de cabelos compridos dança, penetra-se com os dedos e, em certo momento, abaixa a cabeça para que um outro rapaz (também artista) urine sobre ela.

A pessoa de cabelos compridos se identifica como Paulx Castello e/ou Sofia Lacre não se identifica nem como homem, nem como mulher, mas fala de si no gênero feminino. Artista formada pela Universidad Nacional de las Artes (UNA), na Argentina, foi uma das realizadoras do Kuceta (póspornografias): festival de cultura e política sexodissidente realizado em junho do ano passado em São Paulo que, conforme descrição, pretende “exibir algo do que tem sido produzido em relação a sexualidades não normativas”, ou seja, as sexualidades que estejam fora dos padrões usuais de gênero e orientação sexual .

Em seu perfil no Facebook, Sofia publica imagens relacionadas à performance e sexualidade — e um vídeo com a música “O amor e o poder”, de Rosana, além de compartilhar posts e notícias sobre os direitos e dificuldades da população transgênero.

A performance tuitada por Bolsonaro ocorreu durante o BloCU, na segunda-feira (4), no centro de São Paulo, e foi postada em um grupo seguido por menos de 100 pessoas. Dois dias antes, uma apresentação semelhante havia ocorrido em Lisboa, Portugal — mas sem a participação de Paulx Castello. No Carnaval paulista, a estrela do bloco foi a atriz e cantora Jup do Bairro, que cantava, numa sincronia perfeita com o rapaz que urinava (um ator): Eu falei pra minha mãe/que eu queria ser mulher/sabe o que ela me disse?/“Fazer o que, né?” . O universo musical de Jup do Bairro casa-se com o universo artístico e performático de Paulx — ou Sofia. Daí a performance.

Segundo relatos de pessoas presentes no BloCU, a apresentação não se resumiu à chuva dourada. Sofia sacudiu, ainda, os cabelos molhados de urina, atingindo os passantes. Ela e o rapaz que a acompanhava no palco improvisado também se penetraram com os dedos. Antes, de acordo com relatos, ela havia defecado na rua.

De acordo com um relato de um amigo, a performer estava apreensiva na manhã da quarta-feira devido à repercussão do tuíte de Bolsonaro. Evitava se expor, mas estava mantendo contato com amigos e amigas. Após a divulgação do vídeo, ela fechou seus perfis nas redes sociais. Procurados, amigos e colegas de Paulx não quiseram falar com a reportagem, com receio de que Paulx — emocionalmente frágil — seja perseguida.

Em seu post, Bolsonaro usou a cena para sugerir uma reflexão a respeito da “verdade” sobre o “que têm virado muitos blocos de rua no Carnaval brasileiro”. Foi criticado no país— inclusive por aliados de seu governo — e fora dele pela postagem. Horas depois de postar o vídeo, o presidente negou a “intenção de criticar o Carnaval de forma genérica, mas sim caracterizar uma distorção clara do espírito momesco”.

O ato protagonizado por Sofia Lacre pode ser enquadrado no artigo 233 do Código Penal.  O artigo determina que pode ser punido com multa e até prisão de três meses a um ano quem “praticar ato obsceno em lugar público, aberto ou exposto ao público”.

Por ÉPOCA