Revolta de Datena contra Bacci expõe mundo cão do jornalismo policial na TV

Programas criticados pelo conteúdo sangrento são mantidos no ar porque ainda têm público relevante que se deleita com a desgraça alheia

Notícia ruim dá audiência. Sempre foi assim. Manchetes sensacionalistas sobre crimes atiçam a atenção e o sadismo do telespectador: ver o infortúnio dos outros é uma maneira de esquecer das próprias mazelas. Entretenimento alienante.

Sim, o mundo é cruel, injusto, violento. O problema está na abordagem dos fatos pelos jornalísticos policiais. Há exagero em todos os sentidos: o apresentador eleva a voz, a trilha sonora gera suspense, o repórter carrega no drama e a edição cria excessiva expectativa sobre algo que, na maioria das vezes, nem será mostrado.

Atrás das câmeras, o clima se mantém igualmente tenso: olhos atentos no aparelho do Ibope que afere a audiência em tempo real, minuto a minuto. O ‘Brasil Urgente’, da Band, e o ‘Cidade Alerta’, da Record, disputam o telespectador ávido pelo noticiário criminal.

Dias atrás, José Luiz Datena reagiu furioso contra uma provocação de Luiz Bacci. O apresentador concorrente disse que sua atração era a única a ter helicóptero sobrevoando São Paulo durante o telejornal. Intencional ou não, passou a impressão de debochar do programa rival, que está sem aeronave por redução de custos.

No ar, Datena vociferou contra quem “vibra com a desgraça dos outros”. Classificou o tipo de “mau-caráter da pior espécie”. Depois da repercussão ruidosa, afirmou que a crítica não foi endereçada a apenas uma pessoa. Entendedores entenderam.

O ‘Cidade Alerta’ costuma ser a atração de maior audiência da Record. O ‘Brasil Urgente’ se garante no ‘top 3’ da Band. Batem de frente na maior parte de sua duração nos fins de tarde.

Nos bastidores, os jornalistas da redação dos dois programas sofrem forte pressão para conseguir informações em primeira mão, agendar entrevista exclusiva com os personagens principais dos crimes midiáticos e descobrir os trunfos da concorrência antes da exibição.

Enquanto o público se distrai ao ver quem morreu e como foi morto, as emissoras digladiam por preciosos pontos no Ibope explorando a violência endêmica do Brasil e, de vez em quando, vão parar em programas de fofocas pela rixa entre seus apresentadores.

Considerado sensacionalista e apelativo, esse formato de atração sempre teve espaço na TV. Até a Globo se rendeu ao produzir – e agora relançar em nova versão – o ‘Linha Direta’, uma embalagem pretensamente mais jornalística da mesma categoria de produto. O povo quer sangue.