Polícia da moda: Justiça muda regra depois de barrar advogada de minissaia

A advogada Joice Level, barrada no prédio da Justiça Federal em Rondônia por usar saia considerada curta demais. — Crédito: Reprodução.

Em 20 de junho, uma advogada foi barrada na portaria do prédio da Justiça Federal em Porto Velho (RO) porque estava com uma saia curta demais. A comissão julgadora dos trajes consistiu em dois funcionários da segurança, que interpretaram a norma em vigor na época: era proibido entrar no local com roupa medindo 15 centímetros ou mais a partir dos joelhos.

Num mesmo artigo, a norma impedia a entrada de pessoas “portando arma de qualquer natureza” ou que estivesse “indevidamente trajada, segundo os preceitos de austeridade e de decoro exigidos pelo Poder Judiciário”. O texto incluía nas proibições “calções de qualquer tipo, bermudas, shorts, calca legging, camisetas masculinas sem manga, vestuário de comprimento curto (15 cm ou mais medidos da parte superior dos joelhos) ou a expor a região abdominal”.

A justificativa para as proibições era a “austeridade própria do ambiente”. Crianças com até 12 anos de idade eram consideradas exceção às regras. Na prática, cada tribunal do país tem uma regra própria sobre vestimenta. De um modo geral, cabe aos seguranças de plantão avaliar se o visitante pode ou não entrar – uma espécie de polícia da moda.

Depois do incidente, a Justiça Federal em Rondônia alterou a norma para roupas nos tribunais por uma regra mais abrangente. O novo texto proíbe a entrada de pessoa “indevidamente trajada, segundo os preceitos de austeridade e de decoro exigidos pelo Poder Judiciário” – sem o comprimento da saia medido em centímetros. A norma inclui como exceção “indígenas, hipossuficientes e pessoas em situação de rua”, que poderão usar no local “trajes sumários, calçados ou não, observando-se sempre, nessa matéria, o respeito aos costumes, às tradições locais e às condições financeiras e sociais”.

A advogada Joice Level, que foi barrada em junho do prédio, registrou reclamação perante a Comissão da Defesa das Prerrogativas da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) em Rondônia para conseguir acesso ao edifício. Acabou conseguindo.

A Ordem também pediu para que a conduta dos seguranças fosse analisada e para que a norma fosse derrubada. A conclusão do procedimento interno é que os funcionários apenas interpretaram a norma em vigor – portanto, não houve irregularidade. O episódio, no entanto, fez com que o tribunal mudasse a norma.

Joice afirmou que, no dia em que foi barrada, usava uma saia de modelo social, de comprimento “normal”, poucos dedos acima da altura dos joelhos. “Esse é um traje social do advogado. Não era uma minissaia. Faltou bom senso ao segurança para avaliar essa questão”, afirmou.

Para o presidente OAB-RO, Márcio Nogueira, a mudança na norma foi importante para evitar novos constrangimentos a mulheres. “Essa mudança deve impedir a submissão das advogadas a novos constrangimentos. O objetivo da Justiça é atender a população, e não estipular padrões de vestimenta. Permitir o ingresso de advogadas e advogados, estabelecidos pela Constituição como essenciais à Justiça, é fundamental para que os tribunais cumpram seu objetivo”, disse Nogueira.

“A proibição de acesso ao prédio da Justiça Federal em função da saia é um ato discriminatório e desproporcional. É preciso que tribunais e demais órgãos públicos, de todos os Poderes, combatam gestos de humilhação contra mulheres advogadas e de outras profissões”, declarou a presidente da Comissão Nacional da Mulher Advogada do Conselho Federal da OAB, Cristiane Damasceno.

Por Terra