Médicos cubamos deixam o Amazonas até dezembro

Governo federal mostrou em dados que médicos brasileiros são menos interessados em ir a comunidades isoladas comparado aos cubanos © Adneison Severiano/G1

Após o anúncio oficial do Governo de Cuba confirmar a saída no programa federal brasileiro Mais Médicos, 292 profissionais cubanos vão deixar de prestar assistência básica em 59 municípios amazonenses, incluindo Manaus. O total de médicos filiados ao programa no Estado era de 504, segundo último levantamento do Governo do Estado.

Em reunião na embaixada de Cuba, na última quinta-feira (15), foi informado que a saída dos médicos estrangeiros deve ocorrer em até 40 dias contando a partir da data do anúncio. A previsão é de que os voos deixando o Brasil comecem a partir no dia 25 deste mês, separados gradativamente por regiões.

Das 18.240 vagas ofertadas em todo o Brasil, 8.332 estão preenchidas por cubanos, ocupando a maior parcela dos profissionais divididos por nacionalidade. O Ministério da Saúde (MS) apontou que outras 4.525 vagas são preenchidas por brasileiros formados no País, e outras 2.842 por brasileiros formados no exterior.

451 vagas de estrangeiros de diversas nacionalidades estão ocupadas e mais de 2 mil estão ociosas dentro do programa. Com os números, confirma-se que os médicos cubanos são os mais interessados em trabalhar em Saúde da Família, especialidade do programa, do que médicos brasileiros, principalmente em localidades distantes de centros urbanos.

Precariedade

Na capital amazonense, por exemplo, das 83 vagas ocupadas, oito estão preenchidas por cubanos. Nos municípios Canutama, Borba e Beruri, ambos têm três médicos cubanos. Mais longe da capital, em Tabatinga, Amaturá e Guajará, apenas um médico cubano é registrado. A Organização Pan-Americana de Saúde (Opas), responsável pela intermediação do contrato médico com Cuba, confirmou que todos terão que ir ao país caribenho para a rescisão.

O presidente da Associação Amazonense dos Municípios (AMM), Andreson Cavalcanti, chamou o cenário de “muito preocupante para a saúde dos interiores”. Ele lembrou que médicos contratados individualmente cobram caro para residirem nas comunidades e que o incentivo era a ponte que garantia saúde básica aos mais carentes.

“Os municípios têm bastante dificuldade de conseguir as contratações médicas, todos sabem disso. Realmente, o programa veio como uma solução imediata que vem dando certo. É inaceitável que esse caminho regrida”, frisou.

Uma ação para mobilizar a bancada municipalista e a Confederação Nacional dos Municípios (CNM) foi feita pela associação para tentar minimizar os impactos da saída dos médicos. A principal responsabilidade é de cada prefeitura dos municípios nos postos de saúde e nas comunidades rurais.

O MS noticiou que está em processo de finalização da proposta de um novo edital para o chamamento de médicos substitutos. Mesmo com estímulos federais e estaduais, no entanto, o número de médicos brasileiros inscritos em editais passados foi abaixo do esperado.

Políticos amazonenses

O senador reeleito Eduardo Braga (MDB) disse que Cuba tomou uma decisão injusta e que agora caberá ao governo federal brasileiro tomar uma solução rápida e imediata. “O povo não pode ser penalizado com a falta de médicos, principalmente no interior do Amazonas”, declarou.

Na próxima semana, ele fará um posicionamento oficial sobre o assunto a favor do programa. “Estamos falando de nada menos que 8 mil a 10 mil médicos a mais na Atenção Básica de Saúde”, pontuou Braga.

No legislativo estadual, o deputado eleito José Ricardo (PT) criticou a declaração de Jair Bolsonaro, que causou o rompimento do acordo com o governo cubano. Em seu Twitter, na última quarta (14).

José Ricardo disse que por uma questão ideológica, muitos pobres irão ser privados do acesso fácil à saúde básica.

“Ele se manifestou contra no STF (Supremo Tribunal Federal) na época de implantação do programa e continua com o mesmo pensamento atrasado. Cuba atua em 75 países enviando médicos e era o país que mais nos ajudava nesse sentido”, comentou.

Ele aproveitou para falar sobre outros incentivos públicos que também estão perdendo força, recentemente, firmados em governos passados. “Está um desastre. O ‘Minha Casa Minha Vida’ está parado, o ‘Luz Para Todos’ está sem expectativa de crescimento, a ‘Farmácia Popular’ foi desvalorizada em todo o País. Vamos regredir 15 anos no tempo”, opinou.

O que Cuba diz

Em nota, o governo cubano disse que as ameaças de mudanças no termo cooperativo acertado com a Opas são inaceitáveis. “O povo brasileiro saberá a quem responsabilizar pelo fim do convênio”, defendeu. Representantes da embaixada no País disseram que a decisão é irrevogável.

Para os manauenses, a decisão de Bolsonaro foi infeliz para a saúde no Estado. O lavador de carros Reginaldo dos Santos, de 57 anos, disse que em comparação entre médicos brasileiros e cubanos, prefere estrangeiros. “Com a velhice, esperamos ser cuidados de forma melhor. Fui muito atendido por médicos brasileiros, e eles não foram tão prestativos quanto eu queria que fossem”, lamentou.

Para o governo Bolsonaro, o lavador espera mais sensibilidade da gestão pública com os pacientes que dependem desses incentivos. O motorista Paulo Ferreira, de 51 anos, que trabalha no Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu), concorda com o mesmo pensamento. Ele falou que os profissionais de saúde nascidos no País não conseguem atender sozinhos a todas as demandas.

“Não podemos deixar somente os daqui trabalhando. Toda ajuda é bem-vinda. Acho um erro de Bolsonaro se ele deixar que todos os cubanos saiam do Brasil e, principalmente, do nosso Amazonas”, terminou.

(((Em Tempo)))