Justiça Federal manda recolocar corrente retirada por deputado em terra indígena

Retirada com uso de motosserra por Jeferson Alves (PTB), corrente foi colocada de volta por índios da Terra Waimiri Atroari. ─ Foto: Reprodução

A Justiça Federal determinou na noite de sexta-feira (28) que a União e a Fundação Nacional do Índio (Funai) adotem medidas necessárias para manter as correntes de controle de tráfego na divisa entre Roraima e o Amazonas, região da Terra Indígena Waimiri Atroari.

Retirada pelo deputado estadual Jeferson Alves (PTB) com uma motosserra e um alicate, a corrente já havia sido colocada na rodovia antes da decisão, que também obrigou que fosse recolada.

Foi determinado ainda que os dois órgãos enviem agentes de segurança à região para a manutenção da ordem “no que diz respeito à permanência das correntes, pelo período que se mostrar necessário.”

Uma imagem que circula nas redes sociais aparecem os indígenas e policiais rodoviários federais no meio da rodovia, com a corrente estendida pista.

Em vídeos feitos pela própria equipe, o parlamentar afirmou, após cortar a corrente e o suporte de madeira onde ela era fixada, que o controle do tráfego na BR-174 causa “atraso” a Roraima.

Na decisão, o juiz da 2ª Vara da Justiça Federal, Felipe Bouzada Flores Viana manda que a União e Funai tomem providências para impedir atentados aos serviços de controle territorial no trecho que intercepta a Terra Indígena Waimiri Atroari, incluindo a área dos postos de vigilância e das correntes.

A decisão saiu após pedido do Ministério Público Federal, motivado pelo ato do deputado. O magistrado determinou que sejam enviados para a região servidores, policiais federais, policiais rodoviários federais ou agentes militares.

O juiz aplicou multa diária de R$ 50 mil em caso de descumprimento e mandou notificar associações indígenas que residem na Terra Indígena Waimiri Atroari “para que evitem a adoção de medidas mais enérgicas e, principalmente, para que não aumentem o período de bloqueio da BR-174.”

A ordem de enviar agentes de segurança para a terra indígena foi para “assegurar a manutenção da ordem e impedir a prática de novos atos de usurpação das competências da Justiça.”

O controle de tráfego na BR-174 com uso de corrente, entre Roraima e o Amazonas, existe desde a década de 1970. Inicialmente esse trabalho era feito pelo Exército, mas em 1990 essa função foi passada aos indígenas que vivem na terra Waimiri Atroari.

O bloqueio na rodovia é feito, todos os dias, de 18h30 às 5h30. Nesse período fica restrita a passagem de veículos, exceto ambulâncias, carros de autoridades públicas, ônibus e outras situações de emergência. Até as 22h também é liberada a passagem de caminhões com cargas perecíveis.

A legitimidade do uso da corrente pelos indígenas é alvo de discussão na Justiça Federal de Roraima. As comunidades garantem que fazem o controle para evitar acidentes com animais de hábitos noturnos e com indígenas que caçam durante à noite.

A ação de Jeferson Alves foi alvo de críticas. A Associação Comunidade Waimiri Atroari repudiou a atitude do parlamentar e o acusou de ter mantido um adulto e um adolescente em cárcere privado enquanto cortava a corrente. A associação afirmou que deve processar o deputado por ameaça, sequestro, dano e incitação ao crime.

O Conselho Indígena de Roraima (CIR) também se manifestou contra o ato protagonizado pelo parlamentar. Disse que o comportamento incita e reforça o ódio, a discriminação e preconceito contra povos indígenas “culpando-os como sendo entrave para o desenvolvimento do País”.

Na ação que resultou na decisão do juiz, o MPF afirmou que o deputado usurpou da competência jurisdicional da 1ª Vara Federal “ao tentar impor o exercício arbitrário das próprias razões em prol de suas conveniências pessoais e políticas.”

A assessoria do parlamentar afirmou que ele está com a “consciência tranquila” sobre o caso e entende que não cometeu crime porque o uso da corrente é “inconstitucional, ferindo o direito de ir e vir”.