A recente declaração do presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), Herman Benjamin, de que “o crime ambiental compensa no Brasil”, bem explorada em excelente reportagem na última edição da revista Veja, traz à tona uma crítica contundente: a transformação da crise climática em um “Estado teatral”.
A metáfora do “Estado teatral” descreve a inércia governamental de sempre frente à crescente devastação ambiental, um cenário em que medidas simbólicas substituem ações efetivas.
As palavras de Benjamin ecoam uma realidade alarmante: os criminosos ambientais, ao invés de enfrentarem punições pesadas, contam com a leniência e anistia, perpetuando o ciclo de destruição. Isso acontece há décadas ao longo dos governos que se sucedem. Tamanha teatralidade também se reflete na lentidão do Judiciário em tratar questões ambientais.
De um lado, se o desmatamento segue devastador, de outro as ações judiciais se arrastam, deixando impunes os responsáveis. Segundo Benjamin, o desmatamento deveria receber a mesma prioridade que questões de violência doméstica, onde medidas emergenciais têm mostrado maior eficácia.
A comparação expõe a dissonância entre a gravidade da crise climática e a resposta jurídica.
Mas, vale dizer que a falta de ação governamental vai além do Judiciário. O Brasil falha em aplicar medidas coercitivas que desestimulem o crime ambiental, como a suspensão de benefícios fiscais ou a concessão de empréstimos vantajosos para aqueles que destroem os biomas, como Benjamin colocou à Veja.
Em vez de combater as causas estruturais do desmatamento e das queimadas, opta-se por discursos vazios, como o recente anúncio de emergência climática.
Números não mentem
Dados divulgados pelo Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden) e pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) revelam a profundidade da crise.
Até setembro de 2024, o Brasil contabilizou 160 mil focos de queimadas, o dobro em comparação ao ano anterior, cobrindo 60% do país com fumaça tóxica. A seca atinge 71% dos municípios brasileiros, e a projeção é de que esse número aumente para 82% até o final de setembro, afetando praticamente todos os estados.
As consequências desse cenário são devastadoras, tanto para o meio ambiente quanto para a economia. Com a safra agrícola reduzida em 6%, a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) estima uma queda de 21 milhões de toneladas na produção de grãos.
A seca afeta o abastecimento de água e o custo de vida, ao passo que as cidades, cobertas por fumaça e fuligem, figuram entre as que têm o ar mais insalubre do mundo.
Diante dessa realidade, o Governo Federal anunciou a liberação de 514 milhões de reais para combater as queimadas e criou o Conselho Nacional de Segurança Climática.
Contudo, a medida parece insuficiente face à gravidade do cenário. Os recursos são necessários, mas não atingem as raízes do problema. Sem a adoção de políticas rigorosas e a aplicação de penas mais duras para quem comete crimes ambientais, o ciclo de destruição continuará.
A criação de um projeto de lei para aumentar as penalidades para incêndios criminosos seria uma boa medida, mas o Brasil precisa de rapidez e seriedade na execução das leis ambientais. O anúncio da emergência climática pode se tornar mais uma peça desse teatro se não for seguido por ações concretas.
O futuro da Amazônia
Na Amazônia, a situação é particularmente crítica. A destruição da floresta tem impactos globais, afetando o equilíbrio climático e a biodiversidade. Nos próximos meses, o que se pode esperar para a região? A resposta dependerá do quanto o governo conseguirá sair do seu estado teatral e implementar mudanças estruturais.
A suspensão de subsídios para empresas e pessoas envolvidas com o desmatamento deve ser uma prioridade, assim como a fiscalização mais rígida. O fortalecimento de órgãos como o Ibama e o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) também será essencial para conter a destruição.
No mais, programas de recuperação de áreas degradadas, apoio a práticas de agricultura sustentável e investimentos em tecnologias verdes podem contribuir para reverter o presente quadro.
A crise climática no Brasil chegou a um ponto crítico, e as medidas tomadas nos próximos meses definirão o futuro do país, principalmente da Amazônia. Como ressaltou Herman Benjamin, o crime ambiental só compensa se houver a certeza da impunidade.
Para mudar essa realidade, é imprescindível abandonar a teatralidade e encarar de forma efetiva o problema ambiental, antes que seja tarde demais para o Brasil e para o planeta.
Por JUSCELINO TAKETOMI