MANAUS — 24 de fevereiro de 1932 é a data em que as mulheres tiveram reconhecidos, legalmente, seus direitos políticos. Sim, Direitos Políticos porque não foi apenas a conquista do direito de votar, mas dos direitos de votar e serem votadas.
Entretanto, tais direitos foram reconhecidos sob condições. As mulheres casadas só poderiam votar se tivessem a autorização do marido e as solteiras e viúvas, só poderiam tirar o título de eleitoras se comprovassem independência financeira, ou seja, todas as formas de subterfúgios foram utilizadas para manter as mulheres afastadas do processo eleitoral.
Passados 91 anos dessa conquista, as mulheres tornaram-se a maioria do eleitorado brasileiro, hoje, segundo dados do TSE, somos 52,56% de mulheres eleitoras no Brasil, do que se denota a concretização do direito de votar e do papel da mulher enquanto eleitora. No entanto, quanto ao direito de ser votada e eleita, pouca coisa mudou e as mulheres ainda buscam a efetivação desse direito conquistado há exatos 91 anos.
Isso porque a conquista do direito de ser votada, não foi e jamais seria suficiente para dar efetividade ao referido direito, conquistado, a duras penas, pelas mulheres, numa sociedade em que a mesma foi, historicamente, excluída do processo político e, continua sendo, apesar de toda a luta e de todas as ações afirmativas instituídas, com o intuído de remover essas barreiras impostas como forma de afastamento, apagamento e silenciamento da mulher na política.
Desde IV Conferência Internacional sobre a Mulher em Pequim, várias ações afirmativas foram aprovadas no Brasil, começando com a Lei nº 9.100/95 que instituiu a reserva de 20% de vagas para candidaturas femininas.
Em 1997, a Lei nº 9.504/97, elevou para 30% as vagas reservadas para mulheres que desejavam se candidatar.
A partir de 2018, o TSE (Tribunal Superior Eleitoral) decidiu que além do preenchimento de 30% das candidaturas por mulheres, também deveriam ser destinados ao menos 30% dos recursos de financiamento de campanha, conhecido como Fundo Eleitoral, para financiar candidaturas femininas, assim como, a distribuição do tempo de propaganda gratuita.
Não obstante, até 2018 tínhamos apenas 10% de mulheres ocupando cadeiras no Parlamento. Atualmente, tivemos um avanço no quesito diversidade com a eleição de 04 mulheres indígenas, 02 mulheres trans e 09 mulheres negras para a Câmara Federal, o que tem um simbolismo muito grande, num país cujo preconceito e a discriminação estão social, cultural e estruturalmente arraigados, como o Brasil.
Teremos a maior bancada feminina da história da Câmara com um percentual em torno de 18%, tendo o número de mulheres subido de 77 para 90. No Senado o número de mulheres será menor que em 2018, serão 10. Em que pese o avanço, ainda estamos longe de uma representação equânime entre homens e mulheres no parlamento brasileiro e o Amazonas segue sem representatividade feminina nas duas casas legislativas.
Essa baixa representatividade se reflete nas Assembleias legislativas, nas câmaras municipais, nas prefeituras, nas mesas diretora das casas legislativas, como um efeito cascata, impactando de forma negativa a vida, sobretudo das mulheres, cujas políticas públicas que lhes dizem respeito, são definidas e decididas por homens.
Do movimento sufragista até hoje, ainda são muitas as barreiras que as mulheres enfrentam ao ousarem adentrar o ambiente político. A violência política de gênero é uma delas, materializada em ações e condutas como objetificação da mulher, tentativa de silenciamento, interrupções de falas, invasão de seus corpos, assédio, dentre inúmeras outras que, infelizmente tomamos conhecimento ou presenciamos todos os dias no Brasil.
A Lei 14.192/21 tornou crime a violência política contra a mulher, desde a sua edição, segundo dados do CNJ, o Ministério Público Federal contabilizou até novembro de 2022, cento e doze procedimentos apurando fatos relacionados ao tema. É como se a cada 30 dias ocorressem 07 casos de cometimento de humilhação, constrangimento, ameaça, bem como, atos objetivando prejudicar a atuação de uma candidata ou ocupante de mandato, unicamente, em razão de sua condição feminina.
Inobstante, há sim o que comemorar, pois embora de forma lenta, as mulheres estão conseguindo romper o “teto de vidro” que tenta limitá-la ou impedi-la de acessar os espaços de poder.
Que esta data tão simbólica permita uma reflexão sobre a importância do ato de votar; sobre a consciência de que somente através do voto e da representação nos espaços de poder é que poderemos avançar em políticas públicas que contemplem os direitos das mulheres, dando continuidade à luta e, ao mesmo tempo, reverenciando as mulheres que nos antecederam como Bertha Lutz, Maria Lacerda de Moura, Leolinda Daltro, dentre outras que lutaram, bravamente, para que hoje nós tenhamos o direito de concorrer a um cargo eletivo e a liberdade de escolher nossas e nossos representantes, reafirmando que a equidade e o aumento da representatividade feminina na política, só ocorrerá quando mais mulheres decidirem votar em mulheres.
Aparecida Veras — Advogada e membra do GT de Observação, prevenção e combate a Violência Política de gênero do Comitê Amazonas de Combate a Corrupção