
EUA — Na madrugada desta quarta-feira (1º), os Estados Unidos mergulharam em mais um episódio de paralisação governamental — o chamado shutdown — após o Congresso fracassar em selar um acordo para manter o financiamento da máquina pública. Pela 15ª vez desde 1981, o país vê seus serviços federais não essenciais congelados, em meio a um embate ideológico que coloca saúde pública e estratégia eleitoral no centro do furacão político.
O estopim? Um impasse entre democratas e republicanos sobre a renovação de programas de assistência médica voltados a milhões de cidadãos de baixa renda. Os democratas insistem que qualquer medida orçamentária temporária deve incluir a prorrogação desses benefícios, sob risco de deixar 24 milhões de americanos — muitos deles em estados governados por republicanos, como Flórida e Texas — expostos a custos insustentáveis com planos de saúde.
A resposta da Casa Branca foi imediata: em comunicado nas redes sociais, acusou os democratas de sabotar o funcionamento do Estado e cunhou a expressão “shutdown democrata”. Do outro lado, os republicanos, com apoio declarado de Donald Trump, rejeitam vincular saúde e orçamento, alegando que a oposição está usando o financiamento federal como alavanca para impor sua agenda antes das eleições legislativas de 2026.
Trump, longe de apaziguar os ânimos, escalou a retórica. Em declarações recentes, ameaçou demitir servidores públicos e desmontar políticas associadas aos democratas. “Vamos demitir muita gente. E eles serão democratas”, disse, em tom provocativo.
As tentativas de mediação parecem ter esgotado seu fôlego. Uma reunião de emergência na Casa Branca na segunda-feira (29) terminou em impasse. Na terça à noite, o Senado tentou aprovar uma proposta de última hora, mas ela caiu por cinco votos — 55 a favor, contra os 60 necessários para avançar.
Com o orçamento suspenso, o governo entra em modo de operação mínima. Apenas funções consideradas críticas permanecem ativas: segurança nacional, controle de fronteiras, tráfego aéreo e defesa. Milhares de funcionários públicos serão afastados sem remuneração imediata — embora historicamente recebam os salários atrasados após o fim da crise.
Consequências práticas para cidadãos e economia
- Transporte aéreo: A FAA (Administração Federal de Aviação) colocará 11 mil servidores em casa. Enquanto isso, 13 mil controladores de voo seguirão operando sem salário, num setor já fragilizado por déficit de quase 4 mil profissionais. Companhias aéreas já preveem atrasos generalizados.
- Turismo e cultura: Monumentos nacionais como a Estátua da Liberdade e o National Mall fecharão as portas. Parques federais, museus e zoológicos administrados pelo governo também suspenderão atividades.
- Serviços essenciais: Aposentadorias, benefícios por invalidez e programas de saúde continuarão sendo pagos. O correio dos EUA, que se autofinancia, não será afetado. Já programas de alimentação dependerão dos recursos remanescentes.
- Segurança e defesa: Militares (cerca de 2 milhões) permanecem em serviço. Agentes do FBI, patrulhas fronteiriças e forças de imigração também continuam ativos. Contudo, mais da metade dos civis do Pentágono — cerca de 400 mil pessoas — será temporariamente dispensada.
- Economia e dados públicos: A paralisação pode atrasar a divulgação de indicadores econômicos cruciais, prejudicando decisões de investidores e formuladores de política. Pequenas empresas também sentirão o impacto, com restrições no acesso a linhas de crédito e suporte governamental.
O fantasma do shutdown de 2018–2019 paira sobre o momento atual. Naquela ocasião, Trump exigiu US$ 5 bilhões para o muro na fronteira com o México, provocando a maior paralisação da história recente — 35 dias de crise que custaram ao país cerca de US$ 3 bilhões em perdas econômicas.
Desta vez, o jogo político parece ainda mais polarizado. Enquanto líderes trocam acusações, são os cidadãos e a economia que pagam a conta — em aeroportos lotados, parques fechados e salários suspensos.


