
UCRÂNIA — Um número crescente de jovens brasileiros está sendo atraído para a guerra entre Ucrânia e Rússia por meio de um novo e alarmante método de recrutamento: o aliciamento virtual. Em grupos e perfis nas redes sociais, homens com poucos recursos e muitos sonhos estão sendo convencidos a deixar tudo para trás, seduzidos por promessas de documentos facilitados, ajuda com logística, abrigo, e até treinamento militar. Mas a realidade é outra: o “tour mais perigoso da Europa” pode ser o último.
Essa tragédia silenciosa ganhou nome e rosto nesta semana com a morte de Gabriel Pereira, de apenas 21 anos. Natural de Minas Gerais, Gabriel trabalhava como cobrador de ônibus em Belo Horizonte. Em março de 2025, após ser recrutado online, ele embarcou para a Ucrânia com o pouco dinheiro que tinha. Pagou cerca de R$ 3 mil pela passagem e, cheio de esperança, seguiu rumo ao desconhecido.
Mas não houve treinamento, nem suporte real. Ao chegar em Kiev, foi rapidamente enviado ao front de combate — sem preparo, sem passaporte e sem chance de retorno. Gabriel manteve contato com a família até o dia 3 de julho. Duas semanas depois, um ex-voluntário que retornou ao Brasil confirmou a pior notícia: Gabriel havia morrido em combate, próximo à fronteira com a Rússia.
A dor da família é agravada pela falta de respostas. O corpo ainda não foi localizado. Nenhuma autoridade ucraniana ofereceu apoio. E o contrato que previa o translado do corpo em até 45 dias permanece no papel.
Mais casos, mais silêncio
O caso de Gabriel não é isolado. Gustavo Viana Lemos, de 31 anos, ex-integrante da Marinha do Brasil, também teria sido morto em missão após se voluntariar. Segundo dados do Ministério das Relações Exteriores, ao menos 9 brasileiros morreram e outros 17 estão desaparecidos desde o início do conflito.
Muitos desses jovens foram orientados a esconder a verdadeira razão da viagem até mesmo de suas famílias. Alguns tiveram os passaportes retidos, dificultando identificação de corpos e repatriação. A promessa de um ideal heroico é desfeita no primeiro disparo de artilharia.
“Diziam para os meninos que fariam treinamento, mas mandavam direto para o front”, relatou João Victor, irmão de Gabriel.
Um alerta que precisa ser ouvido
O recrutamento informal de brasileiros para a guerra na Ucrânia representa uma crise humana, ética e diplomática. Jovens em busca de propósito estão sendo transformados em números de baixas. Eles embarcam iludidos e, muitas vezes, voltam apenas em memória — se voltam.


