Alunas de medicina zombam de jovem que morreu após transplante

Em um vídeo publicado no TikTok em fevereiro, as estudantes relatam os três transplantes de coração e de rim a que Vitória foi submetida.

SÃO PAULO — A família de Vitória Chaves, uma jovem de 26 anos que faleceu em fevereiro deste ano por insuficiência renal no Instituto do Coração (Incor), em São Paulo, denunciou ao Ministério Público de São Paulo (MPSP) duas estudantes de medicina por exporem o caso nas redes sociais. Em um vídeo publicado no TikTok, as estudantes relataram detalhes sobre os três transplantes pelos quais Vitória passou e criticaram a paciente, alegando que o último procedimento falhou porque ela não teria tomado corretamente os medicamentos. O caso gerou indignação e levou a família a buscar medidas legais.

O vídeo, gravado em fevereiro, não cita o nome de Vitória, mas detalhes do relato permitiram que sua história fosse facilmente identificada. A publicação foi feita no dia 16 de fevereiro, e Vitória veio a falecer no dia 28 do mesmo mês. Além das narrativas das estudantes, comentários de outros usuários da rede social exacerbaram o sofrimento da família, reforçando acusações infundadas contra a jovem. Para os parentes, a exposição foi desrespeitosa e desconsiderou a complexidade da luta de Vitória contra a Anomalia de Ebstein, doença rara que afetou seu coração desde a infância.

Giovana Chaves, irmã de Vitória, explicou ao GLOBO que a família só soube do vídeo recentemente, por meio de um amigo da jovem. Segundo Giovana, as informações divulgadas pelas estudantes não correspondem à realidade: Vitória desenvolveu “doença do enxerto” após o segundo transplante, condição médica que leva o corpo a rejeitar o órgão transplantado. Para a família, além de invadir a privacidade de Vitória, as estudantes contribuíram para disseminar julgamentos equivocados sobre a jovem, que sonhava em ser médica e dedicou grande parte de sua vida lutando contra a enfermidade.

Diante da repercussão, a família buscou inicialmente a direção do Incor e, posteriormente, protocolou uma representação no MPSP para apurar responsabilidades no caso. A Polícia Civil abriu inquérito para investigar possível crime de injúria. Em nota, a Secretaria da Segurança Pública informou que as investigações seguem em andamento. Enquanto isso, as universidades das estudantes envolvidas – Universidade Anhembi Morumbi e Faculdade da Saúde e Ecologia Humana (Faseh) – emitiram comunicados lamentando o ocorrido e prometendo apurar os fatos internamente.

O caso trouxe à tona debates sobre ética médica e o uso responsável das redes sociais por profissionais e estudantes da área da saúde. A Faculdade de Medicina da USP, vinculada ao Incor, destacou que as alunas não possuem vínculo acadêmico com a instituição, mas estavam no hospital para um curso de extensão. Como resposta, a faculdade adotou medidas para reforçar orientações sobre condutas éticas e respeito aos pacientes. Para a família de Vitória, o episódio reforça a necessidade de maior sensibilidade e humanização no trato com histórias de vida marcadas por tanto sofrimento.