No Dia Mundial da Água, não há nada a comemorar no maior Estado brasileiro em dimensão territorial e que detém o mais exuberante rio em volume d`água do planeta: o Amazonas. Tampouco o prefeito David Almeida deve se sentir culpado pelo fato de Manaus, segundo ranking divulgado pelo Instituto Trata Brasil, figurar na 83ª posição do Ranking Nacional do Saneamento.
Na verdade, o problema possui raízes históricas que precisam ser ressaltadas neste momento em que, após o Plano de desenvolvimento local integrado de Manaus (PDLI), datado de 1974, nada de sério e profundo se produziu mirando o planejamento, ou replanejamento, da capital do Estado. Restou uma realidade selvagem a espancar consciências e a suscitar polêmicas, além de instigar tristeza e indignação.
Segundo o Trata Brasil, Manaus possui 97,5% em Indicador de Atendimento Total de Água e, Indicador de Atendimento Total de Esgoto, de apenas 25,45%. Nos Indicadores de Tratamento de Esgoto, os dados mostram que a cidade tem apenas 21,58% no quesito. Talvez esse gargalo tenha a ver com um processo de privatização que em décadas recentes não correspondeu às expectativas de uma cidade pessimamente administrada depois que o saudoso coronel Jorge Teixeira, o Teixeirão, comandou os destinos da capital amazonense entre 1974 e 1978.
De qualquer maneira, o estudo do Trata Brasil chama a atenção de todos nós para uma grande reflexão acerca dos desafios que a cidade enfrenta com relação à questão do saneamento básico, ou saneamento ambiental, tendo em vista as peculiaridades de uma capital fincada bem no meio da floresta amazônica e que chama a atenção do mundo, uma cidade deliberadamente desorganizada e maltratada a partir do surgimento da Zona Franca de Manaus, em 1967.
Urge que o debate sobre os gargalos envolvendo o caos do saneamento da nossa capital venha à tona neste momento especial. Neste Dia consagrado à água, é natural que o drama do saneamento seja abordado com a ênfase devida. Afinal, os gargalos de Manaus também têm que ser debitados na conta de um país que jamais se organizou quanto ao tema e que agora se vê em polvorosa com as consequências dos extremos climáticos.
Conforme Édison Carlos, presidente do Instituto Aegea, as péssimas condições de saneamento afetam, sobretudo, a gigantesca população de vulneráveis do país, onde 61,1% das pessoas vivem sem serviço diário de água tratada morando em domicílios com renda per capita inferior a US$ 5,40 diários (R$ 20,40). Para a coleta de esgoto, o percentual nesse grupo é de 56%, diz o estudo.
Claro está que uma coisa puxa a outra quando o assunto é saneamento, e ainda mais se a denominação for saneamento ambiental, que, destaca o saneamento básico, compreendendo água e esgotamento sanitário, assim como resíduos sólidos e drenagem. Um problema, portanto, profundo, maior, à luz da Lei n.º 14.026/20.
Números de um levantamento realizado pela GO Associados para o Instituto Trata Brasil apontam que um investimento anual de R$ 36,2 bilhões destinado a universalização dos serviços apenas de água e esgoto até 2033 geraria 851 mil empregos; R$ 117 bilhões de produção; e R$ 2 bilhões de arrecadação de impostos.
Se isso pode gerar, no fim das contas, benefícios sociais de tão alto porte, então vale a pena, neste Dia Mundial da Água, provocar o debate a respeito dos gargalos pertinentes a água e a herança maldita do saneamento no Amazonas e, logicamente, em todo o país. Precisamos saber enfrentar essa enfermidade nacional crônica. É mais do que trágico que, no Dia Mundial da Água, a região amazônica, com seus rios caudalosos, amargue crise de água potável.